ADEMAR DELGADO: 'ESTAMOS CORTANDO NA PRÓPRIA CARNE'
Camaçari é dona do 38º maior PIB do Brasil e do segundo da Bahia, atrás apenas de Salvador, com valor estimado em cerca de R$ 12,3 bilhões; a 'Cidade Industrial' é destaque também no IDH (índice de desenvolvimento humano), com taxa de 0,70; mas se engana quem pensa que este município cheio de índices positivos também não está sofrendo com a crise que assola o Brasil; em entrevista exclusiva ao Bahia 247, o prefeito Ademar Delgado (PT), contudo, prefere não lamentar muito pelo momento difícil; ele pede que os camaçarienses e os brasileiros não desanimem, "porque o Brasil é muito maior do que isso e logo vai superar tudo novamente"; Ademar tem orgulho de dizer que foi o primeiro prefeito baiano, "e talvez o primeiro do Brasil", a cortar seu próprio salário, com redução de 20%; ele comenta ainda o processo de reaproximação do ex-prefeito Luiz Caetano e sua relação com a Câmara Municipal; leia a íntegra da entrevista
Romulo Faro_Bahia 247 - Camaçari, maior cidade da Região Metropolitana de Salvador, é dona do 38º maior PIB (produto interno bruto) do Brasil - graças ao polo petroquímico e segundo maior da Bahia, atrás apenas de Salvador, com valor estimado em cerca de R$ 12,3 bilhões. A 'Cidade Industrial' é destaque também no IDH (índice de desenvolvimento humano), com taxa de 0,70, conforme avaliação do (IBGE) Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Mas se engana quem pensa que essa cidade de 281 mil habitantes cheia de índices positivos também não está sofrendo com a crise que assola o Brasil e outras potências econômicas mundiais.
Em entrevista exclusiva ao Bahia 247, o prefeito Ademar Delgado (PT), contudo, prefere não lamentar muito pelo momento difícil. Entusiasta, ele pede que os camaçarienses e os brasileiros não desanimem, "porque o Brasil é muito maior do que isso e logo vai superar tudo novamente".
Ademar tem orgulho de dizer que foi o primeiro prefeito baiano, "e talvez o primeiro do Brasil", a cortar seu próprio salário. O corte foi de 20% nos vencimentos do próprio prefeito, de seu vice e dos secretários municipais. "Não estamos enfrentando a crise com conversa nem com mais pessimismo. Estamos batendo de frente com as dificuldades, cortando na própria carne".
O gestor comenta ainda a relativa dificuldade que tem na Câmara Municipal por causa do rompimento do correligionário e ex-prefeito Luiz Caetano (atualmente deputado federal). Para se ter ideia, dois vereadores do PT fazem oposição a Ademar. Mas ele não baixa a cabeça e consegue administrar a situação. "Ainda assim, não costumamos ter muito problema para aprovar nossos projetos. Muitos deles são aprovados até por unanimidade".
Abaixo a íntegra da entrevista.
Corte de salário
Precisamos ter muita responsabilidade e muito compromisso com a coisa pública. Precisamos mostrar à sociedade que estamos fazendo ajustes para que possamos garantir a prestação dos serviços essenciais com qualidade à comunidade. Passamos uma mensagem de otimismo aos camaçarienses e a todos os brasileiros: nós venceremos a crise. Outras crises já aconteceram e o Brasil é muito maior do que isso. Nós estamos fazendo aquilo que precisa ser feito para que possamos superá-la (a crise) internamente, e espero que o governo de nossa presidenta Dilma, que também está fazendo seus ajustes, possa encontrar uma saída mais rápida para essa crise que nos assombra.
Crise
Camaçari é uma cidade que tem uma grande receita, não podemos negar isso. Agora, temos também uma despesa extraordinária. Nós somos o maior município em extensão territorial na Região Metropolitana de Salvador. Então, isso significa que você tem uma demanda de serviços muito pulverizada, e que onera a administração assustadoramente. Fizemos um plano de cargos e salários, fizemos concurso, e isso gera despesa. A despesa cresce independentemente de você nomear ou contratar alguém. Essa despesa cresce. Então, o que acontece é o seguinte: as receitas caíram, e as despesas continuam crescendo. Os gastos são controlados, água, luz, telefone, tudo foi onerado. Quando você tem uma receita em declínio e as despesas crescendo, isso dá um desequilíbrio muito grande. Então, nós já fizemos muitos ajustes e vamos fazer ainda mais. Tivemos que cortar na própria carne, cortar nossos salários, meu, do vice-prefeito, e dos secretários. Tivemos que cortar gratificações dos servidores, reduzir carga horária. Agora estamos reduzindo o número de veículos. Estamos fazendo os ajustes para que possamos fechar as contas no final do ano sem problemas. Temos aí agora um fato inédito. Segundo a imprensa, há 78 anos um presidente da República não tinha suas contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União. Se por um lado temos as dificuldades de ordem financeira, e por outro lado despesas crescentes, nós temos cada vez mais rigor na aplicação do dinheiro público e assegurar os serviços à população. Você veja que com toda a chuva que tivemos neste ano, a cidade não está esburacada. Fizemos um programa de substituição da iluminação da cidade, trocando aquelas lâmpadas amarelas por lâmpadas mais claras.
Área mais difícil
Sem dúvida é a área de pessoal, por causa dos planos de cargos e salários. Esse é o grande problema. Temos obrigação de estar mensalmente fazendo promoção de servidores, e isso é inflexível, porque está em lei. A partir da Constituição de 1988, os municípios assumiram muitos compromissos e não temos a contrapartida da receita. Então, nós temos hoje que assumir despesas sem a respectiva contrapartida. O serviço de limpeza pública, pela extensão do município, é um serviço muito caro. A área da saúde também é difícil. Temos uma área de 760 quilômetros de abrangência, então o serviço é muito pulverizado e requer muita atenção. Mas com toda essa crise, entregamos nesta semana quatro de oito novas ambulâncias compradas com recursos próprios. As outras quatro estão dependendo de formalizarmos o seguro para começar a rodar.
Encorajamento
Para as grandes empresas o que temos dito é que nós temos regras claras. Temos o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU), que inclusive fui eu quem coordenou sua elaboração. Nenhum dos licenciamentos que concedemos aqui foi questionado por nenhum órgão externo de controle. Então, com essas regras claras e com essa disciplina, nós podemos atrair investimentos. Nós temos aqui proximidade do Porto de Aratu, do aeroporto internacional de Salvador, estamos próximos da capital. Isso tudo nos favorece. Em novembro agora vamos entregar à população - por meio da iniciativa privada, mas claro que temos influência – o primeiro grande shopping aqui no centro da cidade. Temos também mais um shopping que será inaugurado em breve na Estrada do Coco, na orla. São equipamentos importantes para a economia de nossa cidade. Isso é geração de empregos diretos e indiretos. Temos. Hoje mesmo (09/10/15) eu estava aqui cedo discutindo dois empreendimentos imobiliários para servidores. Apesar do momento de crise quase que generalizada, nossa economia está rodando.
Relação com a Câmara
Temos maioria, mas temos divisão interna dentro da base e dentro do próprio PT. Com o rompimento do ex-prefeito Caetano, dois vereadores da base ficaram contra mim. Estamos sinalizando a necessidade de uma pacificação, porque se não, a coisa complica mais ainda. Propus um pacto de convivência para a gente administrar essa situação. Com a perda desses dois vereadores, ficamos com uma posição um pouco desconfortável. Hoje temos oito vereadores de oposição, nove comigo e dois do PT que neste momento ainda fazem oposição a mim. O interessante é que não tivemos dificuldade nas nossas votações até aqui. Todos os nossos projetos foram aprovados, e a grande maioria até por unanimidade. A dificuldade orçamentária no País e no município naturalmente dificulta a relação política. Os vereadores querem que a gente cumpra aquilo com que nos comprometemos (e eu tenho uma boa fama de honrar minha palavra). Então neste momento eu estou tendo dificuldade de cumprir com os compromissos porque a receita caiu assustadoramente. Até agosto, perdemos 30 milhões de reais do que estava na nossa previsão de receita. Isso desequilibra qualquer prefeitura e dificulta o cumprimento de nossos compromissos. Estamos mostrando aos agentes políticos que ou a gente faz uma nova pactuação em cima da nova realidade financeira, ou a gente vai viver num estado de desconfiança terrível. Precisamos ter o que sempre tivemos, nossa credibilidade na relação com os agentes políticos e com a sociedade.
Reaproximação com Caetano
Conversei com as lideranças do PT porque entendemos que é preciso que haja um pacto de não agressão, para que a gente possa lá na frente, no ano que vem, a gente possa ter condições de sentar e estabelecer as definições do processo eleitoral. Mas neste ano, estou muito mais voltado para a questão da gestão. E agora com essas dificuldades financeiras, estou ainda mais voltado para dentro da gestão. Estou muito mais preocupado com nossa administração do que com política. A partir de janeiro é que nós e nossas lideranças vamos sentar para estabelecer os critérios para em março ou abril a gente possa estar tomando a decisão. A população conhece Caetano e a mim também, então não precisa tamanha pressa. Tenho que cuidar mais da gestão. Vou deixar que as coisas fluam, para que aproximação vá se reconstruindo sem o trauma que foi na ocasião do rompimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário